A execução fiscal, regulada pela Lei nº 6.830/1980, é o principal instrumento jurídico utilizado pela Administração Pública para cobrar judicialmente dívidas tributárias e não tributárias. Mas, apesar de sua função essencial, os números revelam um gargalo: segundo o relatório Justiça em Números (CNJ), em 2022, 34% dos 81,4 milhões de processos ativos no país eram execuções fiscais. Em 2024, o índice seguiu elevado, atingindo 31%.
Além da quantidade, o tempo de tramitação também chama atenção: uma execução fiscal leva, em média, 6 anos e 9 meses para ser concluída — mais que o dobro da duração média dos demais processos judiciais (3 anos e 1 mês).
Seguro-garantia em debate
A Lei de Execução Fiscal prevê que o devedor tem cinco dias para pagar ou garantir a dívida (art. 8º). Caso não o faça, o art. 9º autoriza a utilização de mecanismos como fiança bancária ou seguro-garantia para assegurar o crédito.
No entanto, a aceitação desse tipo de garantia sempre foi motivo de controvérsia. Tribunais, como o TJ/SP, chegaram a decidir que a apresentação de seguro-garantia não suspendia a exigibilidade do crédito tributário, criando insegurança jurídica para as empresas e afetando diretamente seu fluxo de caixa.
O entendimento do STJ
A insegurança começou a ser superada em 2023, quando o Superior Tribunal de Justiça analisou o Tema Repetitivo 1.203. Por unanimidade, a Corte definiu que a oferta de fiança bancária ou seguro-garantia — desde que no valor atualizado da dívida acrescido de 30% — suspende a exigibilidade do crédito não tributário, não cabendo ao credor rejeitar, salvo em caso de insuficiência, defeito formal ou idoneidade da garantia.
O julgamento dos Recursos Especiais 2.007.865/SP, 2.037.317/RJ, 2.037.787/RJ e 2.050.751/RJ, relatados pelo ministro Afrânio Vilela, consolidou a tese. A decisão reforça a aplicação conjunta do art. 9º da LEF e do art. 835, § 2º, do CPC/2015, afastando a ideia de que somente o depósito em dinheiro poderia suspender a exigibilidade, como prevê o art. 151 do CTN (aplicável apenas aos créditos tributários).
Benefícios do seguro-garantia
A adoção do seguro-garantia traz vantagens tanto para o contribuinte quanto para a Fazenda Pública.
Para empresas e devedores:
- Menor custo em comparação ao bloqueio de numerário;
- Preservação de capital de giro, fundamental para a continuidade da atividade econômica;
- Possibilidade de substituição de penhoras já efetivadas.
Para o Estado:
- Cobertura integral do débito, incluindo juros e correção;
- Agilidade na satisfação do crédito público;
- Redução da burocracia ligada à administração de bens penhorados;
- Execução mais rápida que a alienação judicial de patrimônio.
Um novo equilíbrio
Apesar das resistências de alguns juízos e procuradorias, que ainda alegam risco de inadimplência, o STJ deixou claro que a rejeição do seguro-garantia só é possível com fundamentação específica. Essa posição busca harmonizar dois princípios: a efetividade da cobrança e a menor onerosidade para o devedor.
Na prática, a decisão cria um cenário de maior segurança jurídica, eficiência processual e previsibilidade, elementos que beneficiam tanto a Administração Pública quanto os contribuintes.